Uma reflexão sobre as pragas
enviadas ao Egito e sua relação com a glória de Deus na Páscoa
Pr. Robson T. Fernandes
Disse
o SENHOR a Moisés e a Arão na terra do Egito: Este mês vos será o principal dos
meses; será o primeiro mês do ano. Falai a toda a congregação de Israel,
dizendo: Aos dez deste mês, cada um tomará para si um cordeiro, segundo a casa
dos pais, um cordeiro para cada família. Mas, se a família for pequena para um
cordeiro, então, convidará ele o seu vizinho mais próximo, conforme o número
das almas; conforme o que cada um puder comer, por aí calculareis quantos
bastem para o cordeiro. O cordeiro será sem defeito, macho de um ano; podereis
tomar um cordeiro ou um cabrito; e o guardareis até ao décimo quarto dia deste
mês, e todo o ajuntamento da congregação de Israel o imolará no crepúsculo da
tarde. Tomarão do sangue e o porão em ambas as ombreiras e na verga da porta,
nas casas em que o comerem; naquela noite, comerão a carne assada no fogo; com
pães asmos e ervas amargas a comerão. Não comereis do animal nada cru, nem
cozido em água, porém assado ao fogo: a cabeça, as pernas e a fressura. Nada
deixareis dele até pela manhã; o que, porém, ficar até pela manhã,
queimá-lo-eis. Desta maneira o comereis: lombos cingidos, sandálias nos pés e
cajado na mão; comê-lo-eis à pressa; é a Páscoa do SENHOR. Porque, naquela
noite, passarei pela terra do Egito e ferirei na terra do Egito todos os
primogênitos, desde os homens até aos animais; executarei juízo sobre todos os
deuses do Egito. Eu sou o SENHOR. O sangue vos será por sinal nas casas em que
estiverdes; quando eu vir o sangue, passarei por vós, e não haverá entre vós
praga destruidora, quando eu ferir a terra do Egito. Este dia vos será por
memorial, e o celebrareis como solenidade ao SENHOR; nas vossas gerações o
celebrareis por estatuto perpétuo. (Ex 12:1-14)
A Páscoa é um momento marcante na história da nação de
Israel. Tão marcante que esta comemoração é realizada não só pelos israelitas,
mas é lembrada, comemorada e distorcida em todo o mundo. Pessoas de todas as
nações comemoram a páscoa, ora de forma equilibrada e bíblica, ora de forma
distorcida e paganizada. Mas, o fato desta data ser lembrada, mesmo que de
forma distorcida, já demonstra a grandiosidade deste evento.
A primeira páscoa está diretamente relacionada com a
escravidão dos hebreus no Egito e com as pragas no Egito. Esta relação ocorre
porque, em primeiro lugar, os hebreus estavam estabelecidos no Egito desde os
dias de José, quando o povo é acolhido naquele país, recebendo proteção, abrigo
e segurança contra a terrível seca que os assolou naquela época (Gn 45:4-8).
Depois, com a morte de José (Ex 1:6) e com a chegada de um novo faraó, quem nem
conheceu a José e nem o Deus de José (Ex 1:8-10), o povo hebreu passou de
hóspede à escravo (Ex 1:12-14).
Essa escravidão durou 430 anos (Ex 12:40) até que o
SENHOR, chamando seu servo Moisés (Ex 3), enviou dez pragas para assolar os
egípcios e para libertar Seu povo, após a décima praga (Ex 12). Para que o povo
lembrasse da escravidão no Egito e da forma maravilhosa como o Senhor o livrou
deveria passar a comemorar a páscoa (Ex 12;17, 24, 42). Esse evento deve ser
considerado tão importante para a vida de Israel que marcou o calendário deste
povo (Ex 12:2), ao dar início ao calendário religioso judaico com o mês de
Abibe[1],
também conhecido como Nisã[2],
que corresponde ao dia 22 de março à 25 de abril de nosso calendário. Então, a
Páscoa é comemorada no dia 14 de Nisã, juntamente com o Chag Hamatzot[3]
(15-22 de Nissan), também conhecida como Festa dos Pães Asmos (Ex 12:15).
Muitas tentativas de explicação científica têm sido
sugeridas para interpretar a ocorrência das dez pragas, que são: 1) Águas em
sangue, דָם (Dam); 2) Rãs, צְּפַרְדֵּעַ (Tsifardeah); 3) Piolhos, כִּנִּים
(Kinim); 4) Moscas, עָרוֹב (Arov); 5) Doenças nos animais, דֶּבֶר (Dever); 6)
Sarna que rebentava em úlceras, שְׁחִין (Shkhin); 7) Saraiva com fogo, בָּרָד
(Barad); 8) Gafanhotos, אַרְבֶּה (Arbeh); 9) Trevas, חוֹשֶך (Choshech); 10)
Morte dos primogênitos, בְּכוֹרוֹת מַכַּת (Makat b'chorot).
Alguns sugerem que tais fenômenos podem ser explicados de
forma natural, como a Hipótese da Origem Vulcânica, em que a explosão do Vulcão
Santorini teria sido a responsável por aquecer a água do Rio Nilo provocando,
consequentemente, a reprodução descontrolada de algas pirrófitas, originando o
fenômeno conhecido como Maré Vermelha, que tingiu as águas do Nilo de vermelho
e desencadeou o restante das pragas. Contudo, por mais ardilosas, engenhosas e
criativas que sejam as modernas tentativas de explicações científicas, nenhuma
delas até agora conseguiu explicar o fato de Moisés saber o que iria acontecer
antes que o fenômeno ocorresse (Ex 7:15,16, 8:2,16,20,21, 9:1-3,9,18, 10:4,21,
11:5), o fato dos fenômenos só ocorrerem no momento em que Moisés afirmou
diante do Faraó (Ex 7:20, 8:6,8,9,17,29, 9:1,8,13,27,28, 10:1,3), o fato de que
todas as águas do Egito se tornaram em sangue e não apenas as águas do Nilo (Ex
7:19), e ninguém até agora conseguiu explicar por que esses fenômenos só
assolaram os egípcios e não os hebreus, que também estavam no Egito (Ex 7:24,
8:3,23, 9:4,7,11,14, 11:7).
O fato é que cada praga, por si só, tinha a finalidade
específica de destronar cada divindade egípcia, a começar e a terminar pelo
próprio Faraó, que representava a própria vida do Egito, por ser visto, adorado
e reverenciado como um deus vivo, a quem tudo pertencia, desde o território,
como a própria vida e existência das pessoas, animais e propriedades. Já que
para o egípcio a figura do Faraó representava a própria existência e unidade do
Egito, bem como a sua esperança de sobrevivência e felicidade, o advento das
pragas demonstra publicamente quem é o verdadeiro e único DEUS, o Deus de
Israel.
A primeira praga transforma toda a água do Egito em
sangue (Ex 7:14-25). Essa praga ataca diretamente as divindades egípcias como: Knum (guardião do Nilo), Hapi (espírito do
Nilo) e Osíris (o Nilo era seu sangue).
A segunda praga é a das rãs (Ex 8:2-6). Essa praga ataca
diretamente a deusa Heket (Anuket - deusa do nascimento), pois para o egípcio a
rã era considerada um símbolo da fertilidade e da ressurreição.
A terceira praga é a dos piolhos (Ex 8:16-19). Essa praga
ataca diretamente o deus Set (deus do deserto), pois era adorado como aquele
que protegia os egípcios das pragas do deserto. Sabe-se que os egípcios eram um
povo muito limpo e que se raspava a cada três dias para se proteger de pragas
naturais que o deserto oferecia. Com isso, tal praga mostra a inutilidade da
adoração à essa divindade.
A quarta praga é a das moscas (Ex 8:20-23). Essa praga ataca
diretamente o deus Uatchit (deus simbolizado pela mosca), pois os egípcios
adoravam insetos como divindades, a exemplo do escaravelho.
A quinta praga é a morte do gado (Ex 9:1-5). Essa praga
ataca diretamente os deuses Hactor (deusa com cabeça de vaca), Ápis (deus-boi)
e Mnevis (touro sagrado de Heliópolis), pois os egípcios adoravam essas
divindades taurinas.
A sexta praga é a das úlceras (Ex 9:8-12). Essa praga
ataca diretamente os deuses Sekhmet (deusa das doenças) e Imotep (deus da
medicina), pois a boa saúde dos egípcios era vista como sinal de proteção
dessas divindades. Nessa praga, Moisés enche a mão de cinzas e a lança ao ar,
fazendo com que os egípcios lembrem de seu ritual de sacrifício humano, em que
faziam o mesmo gesto, quando eles acreditavam que o ar, que também era visto como
uma divindade, disseminava as doenças.
A sétima praga é a saraiva (Ex 9:18-35). Essa praga ataca
diretamente os deuses Nut (deusa do céu), Ísis (deusa da vida) e Set (protetor
das colheitas), pois os egípcios acreditavam que essas divindades lhes
protegiam de tais pragas naturais lhes ajudando na agricultura e pecuária.
A oitava praga é a dos gafanhotos (Ex 10:3-13). Essa
praga ataca diretamente os deuses Osíris
(deus da agricultura), Ísis (deusa da vida) e Set (protetor das colheitas),
pois os egípcios, que viviam basicamente da agricultura, tiveram o restante de suas
colheitas e campos devastados, que ainda não haviam sido destruídos pela praga
anterior, a saraiva.
A nona praga é a das trevas (Ex 10:21-29). Essa praga
ataca diretamente os deus Rá, Aten, Atum e Horus, que são as divindades
egípcias do sol, fazendo com que todo o Egito ficasse em trevas, com exceção da
habitação dos hebreus.
A décima praga é a morte dos Primogênitos (Ex 11:4-8).
Essa praga ataca diretamente os deuses Min (deus da reprodução), Hequet (deusa
do nascimento), Ísis (deusa protetora das crianças) e Osíris (a divindade de
Faraó; o doador da vida), pois até as famílias que não tinham filhos foram
atingidas porque não só o primogênito de cada família morreu mas também os
primogênitos até dos animais dos egípcios. Porém, os primogênitos dos hebreus
não foram atingidos.
A PRIMEIRA PÁSCOA
Disse Moisés ao povo: Lembrai-vos deste
mesmo dia, em que saístes do Egito, da casa da servidão; pois com mão forte o
Senhor vos tirou de lá; portanto, não comereis pão levedado. Hoje, mês de
abibe, estais saindo. Quando o Senhor te houver introduzido na terra dos
cananeus, e dos heteus, e dos amorreus, e dos heveus, e dos jebuseus, a qual
jurou a teus pais te dar, terra que mana leite e mel, guardarás este rito neste
mês. (Ex 13:3-5)
A primeira páscoa, portanto, foi realizada na noite em
que ocorreu a décima praga. Os hebreus foram orientados a sacrificar um
cordeiro, comê-lo com toda a família e vizinhos, se fosse ocaso, comer pães
asmos, ervas amargas e usar o sangue do cordeiro sacrificado para marcar os
umbrais das portas, para identificar que aquela casa estava protegida pelo
sangue do cordeiro.
Simbolicamente, cada elemento utilizado na primeira
Páscoa tem um significado específico, especialmente quando comparado àquilo que
o Novo Testamento nos ensina. As Ervas Amargas no Antigo Testamento simbolizam a
amargura da escravidão (Ex 12:8) e no Novo Testamento simbolizam a amargura da
traição (Jo 13:18 cf. Sl 41:9). O Pão Asmo no Antigo Testamento simboliza a dureza
da escravidão do Egito e saída às pressas (Dt 16:3), e no Novo Testamento simboliza
o Corpo de Cristo sem pecado (Mt 26:26; 1Co 11:24). O Sangue no Antigo
Testamento simboliza a segurança (Ex 11:6,7, 12:7), e no Novo Testamento simboliza
a remissão de pecados (segurança em Cristo) (Mt 26:27,28; 1 Co 11:25). O Cordeiro
(Cabrito) no Antigo Testamento simboliza o inocente que é dado em lugar do
culpado (Ex 12:5-6), e no Novo Testamento simboliza a própria pessoa de Jesus
Cristo (Jo 1:29).
Portanto, diante de tudo o que as pragas representam e
diante do maravilhoso livramento proporcionado pelo SENHOR ao Seu povo, podemos
concluir que em todos os sentidos, em todos os aspectos e em todos os momentos
a glória de Deus foi manifesta, ora destronando falsas divindades e
estabelecendo publicamente a Sua Divindade e Soberania, ora protegendo o Seu
povo de forma gloriosa e ora apontando claramente para Jesus Cristo e Sua obra,
mil e quatrocentos anos antes de sua realização na cruz do Calvário, registrada
nas páginas do Novo Testamento.
[1]
Abibe é um nome de origem cananita e significa “espiga”, porque nessa época do
ano as espigas estavam vigorosas.
[2]
Nisã é um nome de origem acadiana e se refere à época da cevada.
[3]
O Chag Hamatzot é a festa do pão sem fermento que segue a páscoa. A Páscoa
começa dia 14 de Abibe e o Chag Hamatzot vai de 15 à 22 de Abibe.