Autor: Robson T. Fernandes
O sistema feudal origina-se por volta do século IV a partir das invasões dos bárbaros (germânicos) contra o império romano. Constitui-se como um modelo de organização baseado na escravatura e que, segundo Lord Kames, normalmente é precedido pelo nomadismo, isto é, por um indivíduo que leva uma vida errante, um vagabundo, segundo o Dicionário Aurélio. Ainda, segundo Kames, depois de instalado o feudalismo é sucedido pelo capitalismo, isto é, por um sistema econômico e social baseado na propriedade privada dos meios de produção, na organização da produção visando o lucro e empregando trabalho assalariado, segundo o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.
Os senhores feudais recebiam suas terras de reis, como favores especiais, empregavam camponeses para trabalhar na terra de forma que esta produzisse e lhe rendesse lucros. Quando estes servos desejavam ir aos domínios do senhor feudal eram obrigados a pagar uma espécie de pedágio.
Por isso, podemos afirmar que o feudalismo é originado pela decadência do Império Romano, perdurou por toda a idade média e caracteriza-se pelo poder descentralizado, escravatura, economia alicerçada no escambo e agricultura de subsistência.
Quando analisamos o sistema feudal medieval percebemos rapidamente que tal sistema não foi relegado ao passado apenas, mas permanece vivo e atuante no presente através de uma forma eclesiástica distorcida e distanciada dos padrões bíblicos. Isto é, algumas igrejas têm mantido deliberadamente o sistema feudal em sua estrutura. Vejamos:
1) Promoção da escravização de seus membros, impondo-lhes jugos, proibições desnecessárias e impossibilidades de crescimento, pelo menos no seio eclesiástico. Com isso é vetada a possibilidade de um desenvolvimento ministerial e formação de novos pastores, já que naquele sistema só há espaço para um único senhor feudal;
2) São criados a partir do nomadismo. Ou seja, de indivíduos que não têm um “passado claro” e não possuem nem chamado pastoral nem formação teológica necessária para liderar;
3) O resultado que sucede a formação desta igreja é o capitalismo. Ou seja, a formação de uma fonte de enriquecimento pessoal com origem na igreja como propriedade privada. Isto é, a igreja deixa de ser uma instituição filantrópica pertencente a um grupo que a ela é associada mediante o enquadramento em seu estatuto, para ser uma propriedade privada sem estatuto e sem registro, cujos bens e patrimônios estão atrelados ao nome do próprio senhor feudal;
4) A manutenção se dá a partir de favores de reis e da sustentabilidade dos servos. Isto é, para que o líder da igreja sobreviva é necessário que haja o favorecimento de investidores que injetam o capital necessário, ou desejado, em troca da realização de “favores”, retorno de benefícios e uma parceria que gera uma sociedade de interesses múltiplos, pecuniários e materiais. Ainda, na sustentação das atividades da igreja o senhor feudal utiliza a mão de obra dos servos que são – na verdade – os responsáveis pela realização do trabalho, se tornando apenas uma mão de obra substituível e dispensável, que servem como instrumentos de geração de recursos particulares, muito embora continuem sempre no estado de sujeição e serventia;
5) Nos domínios do senhor feudal, isto é, nos bastidores, é empregado o modelo de trabalho assalariado que visa separar trabalhadores que estejam dispostos a dedicar integralidade e confiabilidade aos seus senhores. Todavia, não lhes é oferecido nenhuma perspectiva de um futuro melhor e muito menos nenhuma possibilidade de crescimento e desenvolvimento. Apesar de pagos, continuam na condição de sujeição e serventia;
6) Por último, o feudo é caracterizado pela independência e descentralização. Isto é, a igreja não possui nenhuma ligação denominacional nem comunhão com outras, mas caracteriza-se pelo isolacionismo, tornando-se separada das demais e sem nenhum vínculo, mesmo que seja com outros feudos que sigas modelos semelhantes aos seus.
Diante do que foi exposto podemos chegar à algumas conclusões, porém é importante que estas sejam bíblicas.
A Bíblia apresenta uma série de proibições acerca de diversos assuntos, mas a questão é que essas proibições devem ser apresentadas e não impostas, pois quem convence e converte o coração do homem é o Espírito Santo, e não o próprio homem. No sistema feudal, assim como nessas igrejas, essas proibições são impostas.
A Bíblia afirma que não há pecado em almejar o episcopado (1Tm 3), porém este almejar o episcopado deve ser vivido com o intuito de se obedecer a um chamado do Senhor Deus, e não com o objetivo de se crescer de alguma forma na vida ou de melhorar de posição. No sistema feudal, assim como nessas igrejas, esse desejo é suprimido, oprimido e retaliado pois o senhor feudal sente que sua “posição” está ameaçada por um possível concorrente.
A Bíblia afirma que aquele que almeja o episcopado deve, além de uma série de características, ser testado e estar apto para ensinar (1 Tm 3:2). No sistema feudal, assim como nessas igrejas, o senhor é um líder com um passado não muito conhecido e sem treinamento adequado.
A Bíblia afirma que aquele que deseja o episcopado não deve ser avarento (1 Tm 3:3). No sistema feudal, assim como nessas igrejas, o sistema é uma simples fonte de renda, no qual os recursos são direcionados ao bem estar do líder, que trata verbal e legalmente as propriedades como uma instituição particular, cujos bens estão juridicamente em seus nomes ou nos de seus familiares. Não possuindo estatutos nem atas de fundação. São meramente propriedades particulares abertas ao público pela “benevolência” e “caridade” de seu proprietário.
A Bíblia ensina que a consciência não deve ser vendida (At 24:16; IICo 1:12; ITm 1:19), e muito menos em troca de favores e benefício pessoais, e muito menos se tiver de vender ou alugar o rebanho para isso. Ainda, os membros da igreja devem trabalhar para cumprir o chamado que o Senhor fez para a edificação do corpo de Cristo, e não para o benefício pessoal do senhor feudal.
A Bíblia ensina que o trabalhador é digno do seu salário (ITm 5:18). No sistema feudal, assim como nessas igrejas, o salário daquele que trabalha de forma integral na obra é visto como um favor, e como um instrumento de escravização. Ainda, se este trabalhador tem um chamado ministerial deve haver apoio e incentivo para que este chamado seja concretizado de boa vontade.
Por último, a Bíblia ensina que deve haver comunhão entre os irmãos, pois somos membros uns dos outros e do corpo de Cristo. Essa comunhão não diz respeito a igreja como instituição ou denominação em particular, mas como a consciência do Reino de Deus em nós e entre nós, que compreende irmão de diversas denominações. Desde que estas estejam realmente alicerçadas nos princípios bíblicos. No sistema feudal, assim como nessas igrejas, este ensino é inexistente e procuram viver de forma isolada, tendo uma suposta e aparente comunhão entre si. Porém, tratam com descaso e desinteresse qualquer um que venha a se afastar de sua comunidade, seja por qual motivo for.
Por tudo isso, percebemos com tristeza que muitas igrejas têm se assemelhado a feudos. Por outro lado, temos observado com muita alegria no coração que muitas igrejas têm buscado fugir do modelo feudal e têm buscado um comportamento e um modelo bíblico adequado e coerentemente contextualizado.