sexta-feira, 11 de novembro de 2016

MATEUS 24 E 25, OS ÚLTIMOS DIAS E A VINDA DE CRISTO


Robson T. Fernandes

Os textos bíblicos de Mateus 24 e 25 são alvo de muita polêmica e discussão, tanto pela forma como foram falados por Jesus e escritos por Mateus, como pela natureza dos próprios eventos citados.

A nossa intenção, contudo, não é ter a pretensão de apresentar a palavra final ou irrefutável sobre o assunto, pois estamos cientes da profundidade e complexidade dos textos bem como das controvérsias e de como esse tema suscita debates acalorados. Nossa intensão, portanto, é a de simplesmente ajudar o debate, oferecendo uma ferramenta de estudo, que pode muito bem ter suas falhas e ser, da mesma forma, rejeitado ou refutado, o que é um processo normal no estudo teológico.

O esboço de Mateus 24 se apresenta dessa forma:

1.      Versículos 1,2: Jesus fala da destruição do Templo. Esta profecia se cumpre com o fracasso da Grande Revolta Judaica contra o domínio romano, no ano 70 a.D., quando Jerusalém foi tomada pelas forças do general Tito, que destruiu o templo.

2.      Versículo 3: Os discípulos edema cristo que Ele lhes dissesse quando estas coisas aconteceriam, qual sinal de Sua vinda e da consumação do século.

3.      Versículos 4-28: Jesus fala sobre o surgimento de:
a.       Anticristos (24:5);
b.      Guerras, rumores de guerras, fomes, terremotos (24:6-7), mas declara que isto é apenas o princípio (ἀρχὴ - arche). Após estas coisas, que são apenas o princípio das dores (ἀρχὴ ὠδίνων arche odinon), viria uma fase ainda mais intensa;
c.       Tribulação, em que seriam odiados, maltratados, haveria escândalo, traição, falsos profetas, multiplicação da iniquidade e esfriamento do amor (24:8-12).
d.      Haverá a pregação do Evangelho por toda a terra, e só então viria o fim (τέλος - telos) (24:14). Telos significa conclusão, término.

Até este ponto, ao que parece, Jesus segue uma cronologia, relatando fatos e eventos futuros, já que todos os verbos usados estão no futuro (virão, ouvireis, se levantará, haverá, sereis, (nesse tempo), hão, levantar-se-ão, enganarão, se esfriará, será pregado, virá). Então, temos aqui o relato de eventos futuros, que não se encaixam em Sua época.
É importante observar que Jesus, sendo judeu, falou como tal, e Mateus, que registrou os fatos, sendo também judeu, escreveu da mesma forma. Isto quer dizer que Jesus fez algo que é comum aos textos bíblicos: primeiro conta-se uma situação de forma geral e depois volta-se para falar os detalhes importantes daquilo que foi dito anteriormente. Isso pode ser visto em Gênesis, por exemplo, quando Moisés faz o relato geral da Criação em Gênesis 1 e depois volta para falar do mesmo período de tempo de forma mais detalhada em Gênesis 2. Isso é visto em Apocalipse, quando João fala de eventos até certo ponto, de forma geral, e depois retorna para falar do mesmo período de tempo de maneira mais detalhada.
Seguindo esse estilo, Jesus agora volta a falar do mesmo período com maior riqueza de detalhes. É só comparar o que é dito a partir de 24:9 até 24:14, quando virá o fim, e seu destaque dado ao surgimento do “o anticristo” a partir de 24:15 até 24:28.
Então, a seção que se encontra entre 24:15 e 24:28, cronologicamente se encaixa dentro de 24:9 à 24:14. Jesus fala de um período antes da tribulação (24:5-8), do período que segue, Tribulação (24:9-14), e os detalhes importantes da Tribulação (24:15-28). Observe, ainda, que a mesma lógica de discurso (geral e detalhes) se repete no mesmo texto, quando Ele fala de Sua vinda em 24:27 e volta a falar sobre os detalhes desse evento em 24:29-31. Portanto, de 24:15 à 24:31 temos o relato de eventos que estão dentro de 24:5-14, quando virá o fim.

4.      Versículos 32-35: Parábola. Como de costume, Jesus utiliza uma parábola para ilustrar a verdade apresentada. Para isso utiliza o exemplo da figueira (24:32-35). Aqui surge a questão: Será que todos esses eventos já teriam ocorrido? A Tribulação foi um evento histórico passado?
Acreditamos que não. Especialmente por aquilo que é dito em 24:34: “Em verdade vos digo que não passará esta geração sem que tudo isto aconteça”.

O termo “geração”, ocorrido no texto de Mateus 24, é o grego genea (γενεὰ), e possui vários significados:

1. De acordo com Fritz Rienecker e Cleon Rogers[1]: Raça, geração.
2. De acordo com W. C. Taylor[2]: geração, prole, raça, época.
3. De acordo com F. Wilbur Gingrich e Frederick W. Danker[3]: raça, clã, gênero, contemporâneos, era, período de tempo, família.
5. De acordo com Lothar Coehen e Colin Brown[4]: geração, família, clã, raça, era.

Genea, derivada da raiz gen-, significa “nascimento”, e também “descendência”, e, depois, “descendentes”, “família”, “raça” (isto é, aqueles que são vinculados por uma origem comum) [...] Tanto na Septuaginta e no Novo Testamento seu significado primário é “nação”, “povo” ou “tribo”[5].

Então, só restam duas opções de interpretação para o termo “geração” em Mateus 24:34. Ou significa que aquele povo vivo na época de Cristo vivenciaria todas aquelas coisas, ou a “raça” (família, descendência) daquele povo seria preservada para ver o cumprimento de todas essas coisas.

Se lermos o texto com bastante atenção veremos que Jesus Cristo disse que: o sol escurecerá, a lua não dará seu brilho, as estrelas do céu cairão, os poderes do céu serão abalados, aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem, todos os povos da terra se lamentarão, verão o Filho do Homem vindo nas nuvens etc. (Mt 24:29-31). Ou seja, haveriam eventos cosmológicos e tudo isso culminaria com a Vinda de Cristo.

Jesus disse que esta geração não passaria até que tudo isso acontecesse, mas ninguém da época de Jesus viveu para ver tais coisas, e nem nós mesmos ainda não vimos tais eventos que culminam cm a Vinda de Cristo. Portanto, afirmar que isto se refere a eventos passados, é o mesmo que dizer que a Tribulação já passou e que a Vinda de Cristo já ocorreu. Portanto, é recair no erro praticado por um grupo do século I e que foi reprovado pelo apóstolo Paulo: “estes se desviaram da verdade, asseverando que a ressurreição já se realizou, e estão pervertendo a fé a alguns” (2 Tm 2:18).

Portanto, só resta a segunda alternativa de interpretação do termo “geração”: raça, família, descendência. Aqui, especificamente, Jesus fala sobre a raça judaica. Isto quer dizer que esta raça, este povo (geração), seria preservada até que tudo isso se cumprisse. Em outras palavras, esta “raça” não acabará até que tudo isso se cumpra.

5.    Versículos 36-41: Jesus adverte sobre a “ciência” do tempo determinado para tais eventos, fala sobre o estilo de vinda do mundo nos dias que antecedem e compreendem esses eventos e como será a Sua Vinda.

6.      Versículos 42-51: Jesus adverte sobre o estilo de vida e comportamento daqueles que são Seus, lembrando o caso do ladrão e a fidelidade do servo.

Alguns têm afirmado que a partir de Mateus 24:35 até o final do capítulo 25 o Senhor Jesus mudou o cenário de sua revelação, deixando de falar sobre os sinais, tribulações e mortes para um cenário mais pacífico, como se isso fosse uma evidência de uma outra realidade. Ou seja, como se os eventos da tribulação se referissem a fatos ocorridos da época dos discípulos ou da Igreja Primitiva e que a partir daí estivéssemos vivendo uma outra Era em nossos dias e no nosso futuro.

Discordamos desse raciocínio por algumas razões.

Devemos lembrar que o capítulo 25 começa com “Então” (Τότε - tote), e mostra uma conexão entre o capítulo 24 e o 25. Este termo grego é um advérbio de tempo que tem função demonstrativa. Dessa forma, não tem a função de dar uma continuidade temporal ao texto, como se mostrasse uma continuação cronológica, como se desse a entender que os eventos citados anteriormente ficaram no passado e agora teríamos um tempo posterior de aparente paz. Não!

O advérbio “Então” (Τότε - Tote), é usado para falar de algo que ainda está dentro do espaço de tempo do assunto tratado anteriormente, é algo que ainda está dentro dos “últimos dias”. Por isso, Gingrich, Danker e Robinson apresentam a possibilidade de tradução para esse advérbio como: “naquele tempo”. W. C. Taylor apresenta, ainda, uma terceira opção de tradução para “então”: desde aquele tempo. Ou seja, o “então” (Τότε - tote) não é uma expressão que coloque as informações do capítulo 25 em um tempo desconectado do capítulo 24. Muito pelo contrário, este termo grego ensina que aquilo que será dito no capítulo 25 é uma característica inserida no capítulo 24. Por isso que é um advérbio de tempo com função demonstrativa, como é confirmado pelo Thayer's Greek Lexicon e pelo Strongs.

Portanto, o capítulo 25 não é a apresentação de eventos posteriores àqueles citados em Mt 24.

Como já foi dito, e pode ser visto mais uma vez aqui, na conexão entre os capítulos 24 e 25, aquilo que foi dito de forma geral entre 24:42-51 é apresentado com maior riqueza de detalhes no capítulo 25. Temos, então, uma descrição geral do assunto e depois o seu detalhamento, como é típico em muitos escritos bíblicos, já citados anteriormente.

Isso pode ser comprovado, também ao se observar que em 24:29-31 e em 24:40,41 Jesus fala sobre a Sua Vinda e em 25:31-34 também. Dessa forma, o capítulo 25 está inserido no contexto do 24, como já sugere o advérbio de tempo com função demonstrativa “Então” (Τότε - Tote).

Por isso, e por outras coisas mais, discordamos  da afirmação de que Jesus mudou o cenário de sua revelação em Mateus 24 (agora não mais com sinais, com tribulações e mortes) para um cenário agora 'pacífico' até o fim do capítulo 25, como se Ele estivesse falando de uma outra realidade.

Além do mais, para os que ainda pensam que os últimos dias ficaram para trás, na época de Timóteo e que estaríamos a partir daí vivendo dias "aparentemente tranquilos", os nossos irmãos no Oriente Médio e nos países comunistas, hoje em dia, discordariam veementemente dessa afirmação, pois para eles os nossos dias muito mais parecidos com tribulação do que com tempo de paz.







[1] RIENECKER, Fritz; ROGERS, Cleon. Chave Linguística do Novo Testamento Grego. São Paulo: Vida Nova, 1995. p.53.

[2] TAYLOR, W. C. Dicionário do NT Grego. Rio de Janeiro, JUERP, 1991. p.48.

[3] GINGRICH, F. Wilbur; DANKER, Frederick W. Léxico do N.T. Grego/Português. São Paulo: Vida Nova, 2000. p.46.

[4] COEHEN, Lothar; BROWN, Colin. Dicionário Internacional de Teologia do NT. São Paulo: Vida Nova, 2000. p.895.

[5] Idem.