Uma análise da
influência das traduções bíblicas, confissões de fé, influência dos Puritanos e
dos Irmãos da Vida Comum e a importância da Disciplina Arcana
Pr. Robson T.
Fernandes
A influência da
tradução bíblica na Reforma Protestante
A Igreja de hoje precisa compreender com todas as letras
que a Reforma Protestante imprimiu a sua identidade na cultura dos países que a
adotaram, inclusive debaixo de perseguição e ameaça. Por exemplo, a cultura
alemã foi moldada pelos princípios da Reforma e este legado perdura até os dias
de hoje. Vechia[1]
(2001, p.2), ao falar sobre a educação da comunidade alemã na cidade de
Curitiba, Paraná, demonstra isso da seguinte forma:
A religião protestante previa que os membros da comunidade fossem alfabetizados, sem este requisito seria impossível a prática da religião: cantar os hinos, ler a Bíblia, estudar o catecismo para ser confirmado na fé. A alfabetização deveria ocorrer, preferencialmente, em língua alemã. O protestantismo germânico caracterizava-se pela fusão de elementos religiosos com outros que, no transcorrer do tempo, adquiriram significado sagrado, como é o caso da língua alemã. O alemão exercia a função da língua litúrgica; perdê-la significava a descristianização.
Então, aqui vemos claramente a
influência da religião na cultura de forma positiva. E mais, é notório a
utilização da Graça Comum para a manutenção da identidade, através da
utilização do catecismo e fundamentação dos princípios da fé.
Johann Tauler (1300-1361) foi um frade dominicano alemão,
nascido em Estrasburgo em 1300 e falecido em 15 de Junho 1361. Tornou-se muito
popular, especialmente pela influência que exerceu na Alemanha com a
popularização da teologia. Principalmente, por causa da publicação de sua obra,
Teologia Germânica, que mais tarde exerceu grande influência sobre Martinho
Lutero.
Quando o papa João XXII estabeleceu a doutrina da
sacralização da propriedade, em que a igreja católica intervinha na propriedade
privada, Tauler escolheu ficar do lado do imperador, contra João XXII, em 1339.
Os seus escritos[2] são
considerados obras-primas da literatura de língua alemã. Em 1498, após a sua
morte, seus escritos começaram a ser publicados em Leipzig, depois em Basiléia
e Colônia, em 1522 e 1543, respectivamente.
Martinho Lutero, ainda, deixa para Igreja da atualidade
outro legado, no que diz respeito a preservação de sua identidade. Antes de dar
início à Reforma, propriamente dita, mas já sentindo a sua necessidade, ele percebe
que era necessário, em primeiro lugar, aprofundar-se mais nas Sagradas
Escrituras (GONZÁLEZ, 2008, p.434). Lutero percebe o caos existente, identifica
sacerdotes católicos insatisfeitos com o sistema, mas sabe da necessidade de se
aperfeiçoar no conhecimento da Escritura.
Esta é uma grande lição para a atualidade, pois antes de
qualquer coisa, a Igreja precisa voltar a Escritura e solidificar as suas
bases, para só depois entender quais princípios devem nortear a Nova Reforma.
Ainda, os princípios da Reforma – a
partir do estímulo de traduzir a Bíblia para a língua vernácula – foram um
grande incentivo para o desenvolvimento de algumas gramáticas. Rodrigues (2011,
p.195) confirma afirmando o seguinte:
Mas se a Reforma contribuiu para uniformizar a língua alemã, também é certo que ela aumentou o fosso entre os espaços linguísticos protestantes e católicos. Nestes últimos o latim iria conservar uma posição dominante, em particular nas escolas e através dos escritos dos Padres Jesuítas. Só nos sécs. XVII e XVIII é que o alemão se viria a impor a pouco e pouco como língua nacional, como sucedia com o francês que estimulado o alemão.Se o lugar de Lutero no aspecto relativo à evolução da língua alemã é discutível, já quanto ao seu papel na história da literatura alemã é o acordo mais evidente. Lutero foi um dos escritores alemães maiores e mais profundos. E foi a versão da Bíblia que lhe deu mais nomeada. O especialista alemão H. Schneider disse acerca da Bíblia de Lutero “que ela está no início e foi a norma do conjunto da nossa literatura moderna. Ela foi como a Divina Comédia para os italianos. Pouco importa que tenha sido uma tradução e não uma criação original”.Os grandes nomes da literatura moderna como Schiller, Goethe, Nietzche e outros inspiraram-se na Bíblia de Lutero, mesmo quando emitiram juízos críticos em relação a Lutero, como foi o caso de Thomas Mann.
John Huss (1373-1415) foi um
dos pré-reformadores que atuou na Boêmia, apoiado pelo império, que visava a
limitar a influência e os poderes papais em seu território, que praticava
muitos abusos, sendo, ainda, impulsionado pelas ideias reformistas de John
Wycliffe, da Inglaterra. Conta-se que antes de ser queimado ele disse: “Vocês
hoje estão queimando um ganso, mas dentro de um século, encontrar-se-ão com um
cisne Ganso”. Ele, também, foi responsável pela introdução de acentos na língua
checa, contribuindo substancialmente com esta gramática. Ainda hoje, a sua
estátua pode ser vista na praça central de Praga, a Staroměstské náměstí (Praça
da Cidade Velha).
Por isso, entendemos que, se durante a Reforma
Protestante, Deus levantou homens que defenderam as convicções bíblicas contra
a religiosidade pagã do catolicismo medieval, hoje temos a necessidade de uma
Nova Reforma, para que práticas pagãs também sejam extirpadas do meio
evangélico. Daí, o grito que tem se tornado cada vez mais comum. O clamor por
uma Reforma na atualidade.
Toda a sociedade foi impactada
pelo poder renovador da Reforma, e não apenas em seu aspecto religioso, mas
também na política, filosofia, geografia, economia, estrutura social e na
estrutura educacional.
Na política, porque o centro de
poder e influência papal estava em mudança nos países que abraçaram a Reforma;
Na filosofia, porque tradicionalmente a filosofia da Europa medieval estava
baseada no Escolasticismo[3],
mas agora estava convergindo para a Teologia Bíblica; Na geografia, porque a
Europa medieval estava deixando de ser caracterizada pela navegação fluvial e
iniciava a expansão marítima, o que favoreceu a colonização de novas terras.
Por exemplo, enquanto o catolicismo fez do Brasil uma colônia de exploração, a
Inglaterra fez dos Estados Unidos uma colônia de povoamento; Na economia,
porque com a libertação das garras de Roma parte do dinheiro que era enviado
para o romanismo começa a ter outro destino; Na estrutura social, porque, sob o
domínio do catolicismo, não havia possibilidade de se galgar uma melhora de
vida em termos sociais. Quem nascia pobre morria pobre, mas, com a Reforma, os
reformadores começaram a colocar em prática o mandato social e cultural,
baseados em Gênesis, e, com isso, começou a haver uma melhoria na condição de
vida e, a partir desse momento, era possível ascender de classe social; Na
estrutura educacional porque debaixo do catolicismo quem desejasse receber uma
educação de qualidade deveria viver nos mosteiros, que detinham as bibliotecas
e exerciam influência, domínio e comando sobre as universidades, mas, com a
Reforma, o incentivo à leitura e estudo foi popularizado e as traduções
bíblicas passaram a conscientizar a população, inclusive despertando sobre a necessidade
de se estudar as línguas originais da Escritura (CAIRNS, 2008, p.247-250).
A Literatura dos
Puritanos e dos irmãos da Vida Comum
No período pós-reforma, a
preocupação com a educação e sua qualidade também foram acentuadas. Matos
(2010, online) afirma que:
Um dos primeiros exemplos desse interesse foi a Academia de Genebra, fundada pelo reformador João Calvino em 1559, embrião da atual universidade daquela cidade suíça. As escolas reformadas também se multiplicaram em todos os outros países nos quais se implantou a fé calvinista, como França, Holanda, Alemanha, Hungria, Inglaterra, Escócia e Irlanda.
Nessa jornada de implantação de
um sistema educacional consolidado, os puritanos que estavam na Nova Inglaterra
fundaram o Harvard College, em Massachusetts, no ano de 1636, que,
posteriormente, veio a tornar-se uma das universidades mais conceituadas do
mundo, a Harvard University. Em 1701, os puritanos que estavam em Connecticut
fundaram o Yale College, que, posteriormente, veio a tornar-se, também, uma das
universidades mais conceituadas do mundo, a Yale University. Em 1746, os
puritanos que estavam na costa leste americana fundaram o New Jersey College,
que, posteriormente, veio a tornar-se, também, uma das universidades mais
conceituadas do mundo, Princeton University.
Nessa missão, encontramos sempre
a prática de edificar escolas ao lado das igrejas que surgiam nos EUA.
Para João Calvino, revela Nichols
(1988, p.165), os planos para a Igreja “incluíam um ministério educado e
cuidadosamente escolhido, fiel aos deveres claramente indicados para o mesmo”.
Descrevendo ainda que:
Os planos de Calvino quanto à educação foram inspirados por sua convicção de que a verdadeira religião e a educação estão inseparàvelmente associadas. A preservação e segurança da fé reformada, viu êle, requeriam um povo educado tanto quanto um ministério educado. Seus planos resultaram no estabelecimento de um sistema escolar livre e completo, culminando pela Academia, instituição de grau universitário a que não faltassem os cursos de teologia. Calvino foi incansável nos seus esforços em conseguir os melhores mestres para as escolas de Genebra, os quais, em pouco tempo, se tornaram famosos. Muitíssimos estrangeiros vieram à Academia para estudar teologia e voltaram como ministros protestantes.
No Brasil, a Igreja Presbiteriana
prestou um grande serviço nesse aspecto. Segundo Matos (2010, online), algumas
escolas, centros educacionais e universidades podem ser citadas:
[...] em 1870, a Escola Americana de São Paulo, mais tarde transformada em Mackenzie College; em 1885, a Escola Evangélica de Botucatu; em 1886, a Escola Americana de Laranjeiras (SE), mais tarde transferida para Aracaju; em 1887, o Colégio de Dois Córregos, do Rev. John B. Howell; em 1892, a Escola Americana de Curitiba; em 1903, a Escola Americana de Florianópolis; em 1906, o Instituto Ponte Nova, no interior da Bahia; em 1915, o Instituto Cristão de Castro (PR); em 1924, o Colégio Evangélico de Buriti (MT); em 1928, o Instituto José Manoel da Conceição, em Jandira (SP) [...] em 1873, o Colégio Internacional de Campinas; em 1893, o Instituto Evangélico de Lavras, mais tarde Instituto Gammon; em 1895, o Colégio Americano de Natal; em 1904, o Colégio Americano de Pernambuco, hoje Colégio Agnes Erskine; em 1908, o Colégio XV de Novembro, em Garanhuns (PE); em 1921, a Escola Evangélica Americana, em Varginha (MG) e a Escola Evangélica Harriette Armstrong, em Campo Belo (MG); em 1931, a Escola Evangélica Ruth See, em Nepomuceno (MG); em 1933, o Instituto Bíblico Eduardo Lane, em Patrocínio (MG), e outras mais. Tudo isso sem contar as muitas escolas criadas por pastores brasileiros em diversas regiões do país.
Como resultado de toda essa
dedicação e contribuição na história, podemos ver o crescimento do Evangelho em
meio à sociedade e uma significativa contribuição para o crescimento social.
Ainda, a prática de formação educacional sólida, através da construção de
instituições de ensino não só favoreceu a divulgação da mensagem e sua
solidificação, mas, principalmente, a formação de qualidade daqueles que vieram
a ser ministros do Evangelho.
Entretanto, parece que essa preocupação tem sido perdida no
decorrer dos anos, e, mais ainda, a qualificação e a busca por excelência no
desenvolver dessa missão têm sido relegados ao segundo plano em boa parte dos
casos observados.
Por outro lado, ao citarmos a
qualidade de ensino não estamos nos referindo as atuais exigências de
reconhecimento de diplomas e adequação à agenda do MEC, aqui no Brasil. Esta
tem sido uma das maiores responsáveis pelo abandono da sobriedade
bíblico-doutrinária. Esta qualidade de ensino, citada anteriormente, se refere
ao aprofundamento teológico, a exemplo do que o próprio Martinho Lutero pôde
experimentar, antes de dar início a Reforma.
a) Puritanos
Apesar
de suas divergências com outros grupos cristãos, o puritanismo apresenta
características em comum com tais grupos, tanto de sua época como de toda a
história. Essas similaridades apontam para a forma utilizada pelos puritanos
para a preservação de sua identidade e convicções. Elwell (2003, p.208-213) diz
o seguinte:
PURITANISMO. Um movimento de reforma, frouxamente organizado, que se originou durante a Reforma Inglesa do século XVI. O nome surgiu dos esforços para “purificar” a Igreja da Inglaterra realizados por aqueles que achavam que a reforma ainda não tinha sido completada. Posteriormente, os puritanos também passaram a buscar a purificação de si mesmos e da sociedade [...]O puritanismo, de modo geral, estendeu o pensamento da reforma inglesa, com ênfases distintivas dadas a quatro convicções: (1) que a salvação pessoal vinha inteiramente de Deus, (2) que a Bíblia era o guia indispensável para a vida, (3) que a Igreja devia refletir o ensino específico das Escrituras e (4) que a sociedade era um só todo unificado.
Inicialmente, os puritanos foram bem aceitos, mas isso
não durou muito tempo e após o reinado de Elizabeth, devido as pressões e
perseguições, foram para a Holanda e depois estabeleceram a Colônia de Plymouth,
em 1620, nos EUA. Cerca de cem anos depois, uma série de fatores levou o
puritanismo, como um estilo de vida, ao fim em Massachussets.
Um dos fatos importantes na história do puritanismo é a
forma como ele sobreviveu diante das perseguições e ataques a que fora
submetido. Ainda na Inglaterra, ao final do reinado da rainha Elizabeth, quando
os puritanos começaram a perder as suas forças na sociedade, “voltaram-se para
a única esfera que ainda podiam controlar: suas próprias famílias [...] Quando
as perspectivas dos puritanos melhoraram na década de 1640, essa
“espiritualização do lar” emergiu diante do público.” (ELWELL, idem, p.210).
Os puritanos, então, preservaram a sua identidade no
ambiente do lar, onde estabeleceram cultos, ensinaram a Escritura a partir de
uma orientação ortodoxa e se dedicaram a ajudar os enfermos.
Na preservação da ortodoxia, o puritanismo produziu
grandes nomes na história, cujas obras “compõem a mais extensa biblioteca de
teologia sacra e prática que o protestantismo possui” (ELWELL, idem, p.211), incluindo
a produção da Confissão de Fé de Westminster e os
Catecismos Maior e Breve. Nesse
sentido, Beeke e Pederson (2010, p.39) afirmam que havia grande preocupação dos
puritanos com a formação intelectual dos cristãos, e fazem um paralelo com a
Igreja da atualidade:
Os puritanos entendiam que um cristianismo sem intelecto fomenta um cristianismo sem espinha dorsal. Um evangelho anti-intelectual rapidamente se torna um evangelho vazio e informe que não vai além das “necessidades sentidas”. É o que está acontecendo em muitas igrejas hoje. Tragicamente, poucos crentes entendem que, se houver pouca diferença entre o que os cristãos e os incrédulos creem com suas mentes, logo haverá pouca diferença em como eles vivem. A literatura puritana é uma grande solução para esse problema.
A
partir do século II, o cristianismo passou a compreender que sua espinha dorsal
reside na preservação ortodoxa de suas crenças. Semelhantemente, no puritanismo
encontramos o mesmo pensamento, reforçando a ideia de que a forma como se crê
determina a forma como se vive.
Então,
em resumo, os puritanos, dentre várias características e grande legado deixado,
contribuiriam substancialmente para a preservação da identidade do cristianismo
através do fortalecimento da família naquilo que é denominado de
“espiritualização do lar” ao realizar cultos domésticos e desenvolver um
discipulado no ambiente do lar. O incentivo à intelectualidade dentro desse
grupo foi algo tão notável que legaram à posteridade “a mais extensa biblioteca
de teologia sacra e prática que o protestantismo possui” (ELWELL, 2003, p.211),
pois entendiam que “um cristianismo sem intelecto fomenta um cristianismo sem
espinha dorsal” (BEEKE; PEDERSON, 2010, p.39).
Nesse
sentido, foram os responsáveis pela produção de grandes confissões de fé e pela
fundação de escolas que, posteriormente, vieram a se tornar grandes e
conceituadas universidades, como: Harvard, Yale e Princeton.
b) Irmãos da Vida Comum
A importância dos Irmãos da Vida Comum, no que tange a
preservação da identidade cristã, está em sua influência na educação da época,
na elaboração de um sistema educacional e em sua relação com John Amos
Comenius, considerado pela historiografia como o pai da pedagogia.
Este
grupo apresentou grandes preocupações com a educação e uma de suas principais
características, nesse sentido, foi a utilização da língua vernácula na
educação e na instrução bíblica. Então, Comenius desenvolve a sua
sistematização pedagógica com base no trabalho dos Irmãos da Vida Comum, ao
escrever a Didactica Magna, inspirada pela divisão do trabalho educacional dos
Irmãos da Vida Comum.
Esses
“Irmãos representavam uma reação contra a frouxidão moral e a falta de zelo
religioso então existentes. Muitas de suas comunidades obtinham sua renda do
trabalho de copiar manuscritos, principalmente Bíblias, missas e livros de
orações” (ELWELL, 1992, p.347), e parece que suas atividades também exerceram
influência no início da carreira de João Calvino, na França, para a futura
reforma em Genebra, de acordo com Strand (s/d, p.43).
Cairns
(2008, p.224) faz a seguinte apresentação dos Irmãos da Vida Comum:
[...] Groote tornou-se o líder dos Irmãos da Vida Comum em Deventer. Groote influenciou seu discípulo Florentius Radewijns (1350-1400) a abrir uma casa para os Irmãos da Vida Comum em Windesheim. A ordem era formada por leigos que viviam sob uma regra em comunidade e dedicavam sua vida mais ao ensino e a outros serviços práticos do que à experiência passiva de Deus, como ensinara Meister Eckart. Os dois grupos se empenharam pela educação da juventude e abriram grandes e ótimas escolas. Outras casas do grupo foram fundadas por todos os Países Baixos.A Imitação de Cristo contribuiu mais que qualquer outro livro para aumentar a duradoura reputação dos Irmãos da Vida Comum. Esse livro é associado ao nome de Tomás à Kempis (1380-1471) ou, como era conhecido então, Tomás Hemerken de Kempen.
A
influência educacional dos Irmãos começa com John Cele, amigo de Groote, que,
segundo Eby (1970), foi o primeiro dos Irmãos a se tornar professor, assumindo
a direção da escola da cidade de Zwolle, de 1374 até 1417. O seu principal
destaque foi a divisão do ensino em oito classes graduadas, em que as duas
últimas eram lideradas por especialistas nas matérias lecionadas.
Hyma
(1924, p.288-290) revela que John Sturm, um membro dos Irmãos da Vida Comum,
destacou-se como grande educador quando os Irmãos eram quase os únicos
responsáveis pela gestão das escolas em Liège, Deventer, Zwolle e Wesel. Após o
ano de 1500, eles se tornaram mais interessados em
educação do que em qualquer outra coisa, já que seu trabalho de cópia manual de
textos estava ameaçado pela chegada da imprensa. Os irmãos da Vida Comum, por
volta de 1530, foram responsáveis por enviar centenas de alunos para as
universidades de Paris, Louvain, Colônia e Heidelberg, que se destacaram
grandemente. As suas escolas em Delft, Utrecht, Groningen, Liège, Bruxelas,
Gante, Cambray, Munster, Rostock, Culm, Marburg, Hulsbergen, Cassel, Deventer,
Zwolle, Wesel, Emmerich, Magdeburg, Hildesheim e Mechlin, juntas, enviavam
centenas de alunos todos os anos para as universidades, e cinquenta professores
para reformar outras escolas. Dessa forma, entre os anos de 1400 e 1500,
dificilmente qualquer estudante de Paris, Louvain, Colônia, Heidelberg ou Basel
poderia ter escapado da influência das ideias dos Irmãos da Vida Comum.
Enquanto os místicos da época defendiam uma contemplação
mística do Divino, os Irmãos da Vida Comum fizeram uma abordagem mais prática
do cristianismo, na tentativa de estimular a renovação da santidade e devoção.
Por isso, são identificados, também, como a Devotio Moderna, pois buscaram
associar aquilo que era meditado com aquilo que era vivido.
Quando este movimento não se opunha a alguns dogmas
católicos e à sua hierarquia, criticava a corrupção existente na igreja. Com
isso, ao enfatizar o relacionamento pessoal com Deus, ao mesmo tempo, eliminava
o papel da igreja católica de se apresentar como intermediária ou medianeira.
Daí, a sua influência para a vida de alguns homens que viriam a ser
reformadores.
Então,
em resumo, os Irmãos da Vida Comum
desenvolveram um elaborado sistema educacional através de John Amos Comenius,
considerado como o pai da pedagogia. Essa elaboração pedagógica do ensino
contribuiu consideravelmente para a organização didática do ensino e,
consequentemente, para a transmissão mais adequada do cristianismo em sala de
aula, de forma sistematizada com graduação nas salas e professores
especializados nas suas referentes disciplinas. Aqui, vemos a contribuição de
Tomás à Kempis, A Imitação de Cristo, que é uma exortação à oração e às
práticas devocionais e também é considerado como um dos maiores tratados de
moral cristã. A influência dos Irmãos da Vida Comum na sociedade foi tal que
passaram a enviar centenas de alunos todos os anos para as universidades, o que
influenciou a Europa em seus dias.
A importância das
Confissões de Fé
Após
o conflito com o gnosticismo no primeiro século e o surgimento das heresias
cristológicas e trinitárias, a Igreja passou a entender a importância da
preservação de sua identidade através da ortodoxia[4]. Com
isso, o surgimento de credos, confissões e catecismos se multiplicaram, com o
objetivo de explicar a fé de forma coerente, sistemática e fiel à Escritura.
Ainda, diversos grupos cristãos passaram a utilizar basicamente as mesmas
“estratégias” para a preservação de sua identidade. Portanto, a principal
importância dos Credos e Confissões está na promoção e ensino de meios
didáticos que facilitem a memorização do conteúdo bíblico essencial à fé
Cristã.
Uma
forma de se manter a integridade da identidade cristã na história foram as
produções de Credos, Confissões de Fé e Catecismos. Ao verificarmos tal fato,
nos deparamos com uma grande quantidade desses documentos, que visam a,
inicialmente, apresentar de forma clara, objetiva e fiel um resumo daquilo que
as Escrituras afirmam e o que é essencial para se caracterizar um cristão
verdadeiro.
Aqui
surge a importância do estabelecimento dos princípios da fé cristã por meio de
uma confissão clara, objetiva e fiel às Escrituras. Por essa razão, os antigos
davam tanta importância à elaboração de credos e confissões que apresentavam de
forma clara e objetiva a fé bíblica.
No
decorrer dos anos, os principais credos e confissões criados foram: Séc. IV
(325) Credo de Nicéia; Séc. IV (390) Credo Apostólico; Séc. V (450) Confissão
de Fé de Patrício da Irlanda; Séc. V (451) Credo de Calcedônia; Séc. VI (1563)
Catecismo de Heidelberg; Séc. VII (670) Credo de Atanásio; Séc. VII (1618-1619)
Cânones de Dort; Séc. VII Breve Catecismo; Séc. XII (1120) Confissão de Fé
Valdense; Séc. XVI (1517) As 95 Teses de Martinho Lutero; Séc. XVI (1529)
Catecismo Menor de Martinho Lutero; Séc. XVI (1529) O Credo de Lutero; Séc. XVI
(1530) Confissão Augsburgo; Séc. XVI (1544) Confissão de Fé Valdense; Séc. XVI
(1558) Confissão de Fé de Guanabara; Séc. XVI (1560) Confissão de Fé Escocesa;
Séc. XVI (1561) Confissão Belga; Séc. XVI (1562) Segunda Confissão de Fé
Helvética; Séc. XVII (1617) Os Sete Artigos da Igreja De Leyden; Séc. XVII
(1632) Confissão de Fé de Dordrecht; Séc. XVII (1646-1649) Confissão de Fé de
Westminster; Séc. XVII (1689) Confissão de Fé Batista; Séc. XVII Catecismo
Maior; Séc. XVIII (1742) Confissão de Filadélfia; Séc. XIX (1833) Confissão de
New Hampshire; Séc. XX (1934) Declaração Teológica de Barmen; Séc. XX (1974)
Pacto de Lausanne; Séc. XX (1978) Declaração de Chicago Sobre a Inerrância da
Bíblia.
Sobre o Credo Apostólico, o mais conhecido e adotado,
Ferreira e Myatt (2007, p.21) fazem a seguinte declaração:
O credo afirma claramente o caráter trino de Deus, a encarnação de nosso Senhor Jesus Cristo, sua morte, ressurreição e ascensão, a igreja como criação do Espírito Santo, o perdão dos pecados, a ressurreição do corpo e a vida eterna.Os pais da igreja tinham consciência da futilidade de argumentar com os hereges com base somente nas Escrituras, cujo significado eles podiam torcer - como de fato freqüentemente torciam. Por isso eles apelaram ao credo, não só como resumo dos temas centrais da Escritura, mas como conteúdo mais básico dos pressupostos cristãos, que tinha sido preservado intacto na igreja desde os dias dos apóstolos. Neste caso, não se trata de subordinar as Escrituras à tradição, mas oferecer uma declaração sucinta dos pressupostos, sobre a qual não poderia haver debate algum. Então, ainda que sejam as Escrituras que dêem forma ao credo, serão os temas básicos deste documento que irão controlar nosso estudo das Escrituras.
O
Credo Apostólico[5]
não surgiu de forma programada, mas foi sendo elaborado diante da necessidade
que o cristianismo possuía de apresentar uma síntese fiel das doutrinas
centrais da fé, especialmente diante dos ataques a que era submetido.
Creio em Deus Pai, Todo-poderoso, Criador do Céu e da terra.Creio em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor, o qual foi concebido por obra do Espírito Santo; nasceu da virgem Maria; padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado; ressurgiu dos mortos ao terceiro dia; subiu ao Céu; está sentado à direita de Deus Pai Todo-poderoso, donde há de vir para julgar os vivos e os mortos.Creio no Espírito Santo; na Santa Igreja Universal; na comunhão dos santos; na remissão dos pecados; na ressurreição do corpo; na vida eterna. Amém.
A situação dos
cristãos na Alemanha Nazista (Confissão de Barmen)
Hitler
e seu sistema educacional nazista utilizou a ideia darwinista da sobrevivência
do mais apto para afirmar que o homem tinha o direito de ser tão cruel quanto a
natureza, ensinando as crianças alemãs a serem indiferentes diante do
sofrimento, abdicando de suas próprias consciências, utilizando todos os meios
e recursos para isso, incluindo a Bíblia, pois enquanto o apóstolo Paulo dizia
“não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim” (Gl 2:20), os nazistas, através
da propaganda de Hermann Göring, diziam: “Não sou eu quem vivo, mas o Führer
vive em mim!” (NASCIMENTO, 2012, p.28).
A
sociedade alemã, berço da Reforma Protestante, agora aderia a toda sorte de
ismos em nome de um ideal, o ideal nazista, o que incluía darwinismo,
cristianismo e hinduísmo. Nesse sentido, Lutzer (apud NASCIMENTO, idem, p.29)
afirma que “as crenças hindus formavam o corpo doutrinário dos líderes da SS e
ajudaram a justificar a ‘solução final’”. Além desses fatores, sociais,
científicos e religiosos, havia os fatores filosóficos e teológicos envolvidos.
Friedrich Nietzsche, defensor de um arianismo universal e autor de alguns
textos de teor antissemita, foi uma das influências sobre o nazismo, como o próprio
Lutzer (apud NASCIMENTO, idem, p.38) revela ao afirmar que “Hitler, com
freqüência, visitava o museu de Nietzsche em Weimar e posava para fotos em que
fitava deleitado o busto daquele grande homem [...] a obra de Nietzsche foi
usada [...] para liberar os demônios do inferno”. Isso foi reforçado pela
influência que Nietzsche exercia na população alemã, especialmente após a 1ª
Guerra, quando suas obras se tornaram bastante populares na Alemanha,
tornado-se uma lenda na época.
O
liberalismo Teológico, ainda, foi outra grande influência na vida do
cristianismo alemão e que o levou a aderir ao nazismo. Isso porque o seu método
de interpretação, o Histórico-crítico, trabalhou na desconstrução da ortodoxia
bíblica, ao utilizar os pressupostos iluministas para reconstruir uma nova visão
da Bíblia e do mundo através das obras de Albert Ritschl, Adolf von Harnack e
Ernst Troeltsch. A influência do liberalismo nas igrejas alemãs no século XIX
foi assustadora e cooperou, trabalhou, para construir um Jesus diferente
daquele apresentado na Escritura, bem como a Sua mensagem. Com isso, passaram a
viver um cristianismo diferente daquele pretendido pela Escritura, e, por isso,
viveram um cristianismo que não era Cristianismo.
Todos
esses fatores combinados contribuíram para que a Alemanha caminhasse na direção
que tomou, já que as ideias de Nietzsche associadas ao Liberalismo Teológico
estavam na mente de todos.
Enquanto
os cristãos alemães organizavam a Igreja do Reich, de natureza nazista, Walter
Künneth e Hans Lilje fundaram em 9 de maio de 1933, o movimento “Jovens
Reformadores” que tinha como proposta manter a integridade da Igreja e sua
independência do nazismo. Ferreira (2010, p.15) diz o seguinte:
Em setembro de 1933, reagindo contra a adoção, pela igreja, do Parágrafo Ariano (nova lei que obrigava todos os servidores públicos e suas esposas a “não possuir sangue judeu”), os “Jovens Reformadores” se tornam a “Liga Emergencial dos Pastores” (Pfarrernotbund), fundada pelos pastores Herbert Goltz, Jacob Gunther e Eugene Weschke, aos quais se juntaram Martin Niemöller, pastor da paróquia de Berlin-Dahlem, e Dietrich Bonhoeffer. Seus objetivos eram: (1) renovar a fidelidade às Escrituras e à doutrina; (2) resistir aos que atacavam as Escrituras e a doutrina; (3) ajudar financeira e materialmente aos que eram perseguidos; e (4) repudiar o Parágrafo Ariano. Em 13 de novembro, uma assembléia de vinte mil “cristãos alemães” iniciada ao som do hino “Castelo Forte” foi realizada no Palácio dos Esportes de Berlim, afirmando: (1) a necessidade de se remover todos os pastores que se opusessem ao nacional-socialismo; (2) a expulsão dos membros de origem judaica; (3) a aplicação do Parágrafo Ariano; (4) a remoção do Antigo Testamento das Escrituras; (5) a remoção de aspectos que não fossem germânicos da liturgia; e (6) a revisão do Novo Testamento por meio da adoção de uma interpretação mais “heróica” e “positiva” de Jesus, não mais como o crucificado, mas como rei que lutou contra a influência judaica.
A Liga Emergencial dos Pastores foi dissolvida após uma
reunião de alguns líderes com Hitler, quando uma gravação interceptada pela
Gestapo revelava que Niemöller e Künneth conversaram sobre a formação da Igreja
Livre, caso Hitler não aceitasse as suas reivindicações. Mas, antes disso, Karl
Barth reuniu trezentos e vinte pastores e conselheiros para uma reunião em
Barmen, que apresentava a correta compreensão das confissões na atualidade.
Essa reunião foi o marco inicial para a futura Declaração de Barmen, que, no
Sínodo de Barmen[6],
foi apresentada como Declaração Teológica de Barmen[7],
produzida por Karl Barth, Hans Asmussen e Thomas Breit. Aqui surge o que é
chamado de “Disputa pela Igreja”[8]. Thimme
(apud FERREIRA, idem, p.17), deu o seguinte testemunho:
Uma agitação se espalhou pelo grupo de tal forma que os homens começaram a chorar abertamente. De forma totalmente espontânea, sem que ninguém dissesse algo, alguém anunciou: “Agora vamos cantar Nun danket Gott”! [‘Agora, damos graças a Deus’]. Esse foi o ponto alto de Barmen e, em certo sentido, o ponto alto da minha vida, porque com isso, na verdade – e esta era a única coisa decisiva sobre Barmen – determinamos a identidade da igreja.
Ainda, sobre a Declaração de Barmen, Ferreira (idem,
p.23) faz o seguinte comentário:
[...] em 31 de maio de 1934 foi aprovada a Declaração Teológica de Barmen, “o mais importante documento que surgiu na igreja desde a Reforma”. Esta não é propriamente uma confissão de fé, mas uma “declaração teológica a respeito da situação atual da Igreja Evangélica alemã”, aprovada num ambiente descrito por vários dos participantes como de “miraculoso senso de unidade”.
A
importância dessa Declaração está na clareza e aplicação de suas teses, nas
quais fica claro a afirmação da autoridade única de Cristo sobre a Igreja, a
afirmação da segurança e unidade da Escritura, o senhorio de Cristo sobre a
Igreja, os diversos ofícios da Igreja devem servir à comunidade de fé a não
para dominá-la, o reconhecimento do Estado como instituição Divina e a sua ação
deveria estar subordinada à Escritura, a Igreja deve proclamar a mensagem da
graça libertadora de Deus em Cristo através da Palavra e dos sacramentos.
Com
isso, a partir do movimento Jovens Reformadores surge a Liga Emergencial dos
Pastores e desta tem início a Igreja Confessante (Die bekennende Kirche),
composta por quase sete mil pastores (FERREIRA, idem, p.17). Com a
intensificação da perseguição nazista Karl Barth é expulso da Alemanha em 1935
e Hans Kerrl é empossado como Ministro para Assuntos da Igreja, na tentativa de
controlar os protestantes. Ainda em 1935, aproximadamente setecentos pastores
da Igreja Confessional foram presos, porque produziram um documento para ser
lido nas igrejas no qual reprovavam os “cristãos alemães” e os “deuses falsos”
do nazismo.
Em
1936, a nova liderança da Igreja Confessante assume e, da mesma forma, prepara
um documento reprovando os “cristãos alemães”, o antissemitismo e exigindo que
o Partido Nazista não interferisse nos assuntos da Igreja. Este documento,
enviado à Hitler, marcou o início da perseguição declarada contra a igreja
protestante, quando quarenta e oito pastores foram presos e alguns assassinados
em campos de concentração. Em 1937, o “Decreto de Himmler” confisca todos os
fundos da Igreja Confessante, as ordenações ao pastorado e as escolas e
seminários são proibidos. Em 1938, os pastores passaram a ser obrigados a
prestar juramento de lealdade a Hitler.
Então,
enquanto a grande maioria de pastores e igrejas evangélicas se submetiam ao
nazismo e prestavam apoio a Adolf Hitler, uma minoria lutava contra os rumos
que a Alemanha seguia, e um desses nomes foi Dietrich Bonhoeffer.
A Disciplina Arcana e
sua proposta para o ensino bíblico
Temos vivenciado, mais
recentemente, uma constante e frequente ridicularização do Evangelho e dos
evangélicos, que são apresentados em forma de caricatura. Sabemos que muito do
quem sido afirmado encontra respaldo no mal testemunho e péssimo exemplo que
têm sido dados. Mas, por outro lado, parte do problema ocorre porque muitos
cristãos não têm tido a preocupação em preservar, de forma respeitosa e
reverente, os princípios mais importantes e profundos da fé cristã. Verdades
essenciais à fé têm sido tratadas com desprezo e superficialidade, e isto faz
com que assuntos importantes sejam vistos como irrelevantes. Isso tem gerado
dentro do seio da própria Igreja uma indiferença, desrespeito e desinteresse
por aquilo que deveria ser cultivado e estimulado como fonte de vida
espiritual.
Por exemplo, o cuidado e zelo com
as ordenanças e com as doutrinas bíblicas deveriam ser mais frequentes e
efetivos no cristianismo, mas, ao invés disso, vemos pastores que não são
claros quanto às Confissões de Fé, professores que não são bíblicos e alunos
que, em termos bíblicos, não sabem de onde vierem, para onde vão e nem o que
estão fazendo aqui. Cristãos mal instruídos por professores mal instruídos que
foram induzidos por pastores mal instruídos. Por isso, temos presenciado as
consequências de uma reação em cadeia.
A Igreja primitiva tinha certo
cuidado com a exposição das verdades bíblicas por diversas razões. Mas, dentre
elas, a preservação de sua identidade, a preservação da integridade da doutrina
e a boa instrução de seus discípulos certamente eram algumas dessas razões. “Os
cristãos deviam evitar tudo o que podia lembrar a mitologia ou as frivolidades
do paganismo” (PELLISTRANDI, 1978, p.73). Daí, o cristianismo passa a adotar a
Disciplina do Segredo, ou Disciplina Arcana, especialmente diante da
perseguição.
Bilheiro (2008, p.64) diz o
seguinte:
O surgimento da Disciplina do Arcano – regra não expressa, mas difundida de não retratar, explicitamente, mistérios da religião para evitar reconhecimento pelos leigos – refletia o contexto das seguidas perseguições aos cristãos: era preciso que a religião não ficasse discriminável nas obras, que estas só pudessem ser percebidas e interpretadas por iniciados, por integrantes da religião.
A Disciplina Arcana é uma prática
que impõe silêncio para os cristãos iniciados, não só com relação aos seus
rituais, a exemplo do Batismo e Ceia, mas também com relação às doutrinas e
crenças. Os estudos sobre essa disciplina têm sido realizados com mais
frequência nos últimos anos e o núcleo de seu ensino se encontra no judaísmo
helênico, constituindo-se como o fundamento para a tradição oral secreta do
Cristianismo. Sobre ela, Champlin (2006, p.180) diz o seguinte:
Um termo cunhado no século XVII, denotando a prática de certos cristãos antigos, que ocultavam certos ensinos e cerimônias dos catecúmenos e pagãos, no desejo de impedir mal-entendidos. O termo vem do latim, arcanus, “escondido”. A forma arcanum indica um segredo ou mistério, um segredo da natureza, um segredo da medicina. Muitos escritos antigos mencionam isso, no Oriente e no Ocidente, mas a prática cessou após o edito de Milão (313). Teodoreto145 revela o espírito dessa prática ao dizer: “Falamos obscuramente dos mistérios divinos por causa dos não-iniciados; mas, depois que estes se retiram, ensinamos claramente aos iniciados”. (Questão 15). Quando os pagãos eram ensinados, era explicado o nascimento, a morte e a ressurreição de Jesus, mas não o batismo, a santa comunhão, a trindade, etc.
Uma das confusões muito comuns ao
se tratar da Disciplina Arcana ocorre porque era uma prática das chamadas
Religiões de Mistério, que eram religiões que buscavam ocultar as suas crenças
daqueles que não faziam parte de sua fé. Daí a expressão Arcanus. O fato é que
o termo não se refere à uma religião, em particular, mas à prática de manter um
conjunto de crenças em segredo. As principais religiões do passado, Religiões
de Mistério, que adotaram a Disciplina Arcana foram Mistérios de Elêusis,
Orfismo, Pitagorismo, Culto a Ísis, Culto a Mitra e o Gnosticismo. Mais
atualmente, temos a Maçonaria e o Rosacrucianismo como exemplos.
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REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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NOTAS
[1] A Profa. Dra. Ariclê Vechia
demonstra a relação entre a Reforma protestante e a cultura alemã em seu artigo
para a Universidade Tuiuti do Paraná.
[2] Parece que o entendimento
bíblico de Tauler sobre a ação de Deus e a atitude do homem vieram,
posteriormente, ajudar Lutero a compreender a Doutrina Bíblica da Justificação
pela Fé. Em 1522, um de seus sermões foi publicado em Leipzig
[3] A Escolástica era uma
conciliação entre a fé cristã e o racionalismo da filosofia grega, enfatizando
a dialética. A Summa Theologica de Tomás de Aquino é um belo exemplo da
escolástica.
[4] Ortodoxia é um termo originário
do grego (orthos: certo, doxa: opinião) que significa crença correta, que está
de acordo com o ensino bíblico, e é o oposto de heterodoxo ou de heresia.
[5] É chamado de Credo Apostólico,
porque o termo “Credo” tem origem no latim e significa “Creio”, e é Apostólico
não porque os apóstolos o elaboraram, mas porque, segundo Efésios 2:22, a
Igreja está fundada na doutrina dos apóstolos.
[6] O Sínodo de Barmen foi um
concílio que reuniu comunidades luteranas, reformadas e unidas.
[7] Declaração Teológica de Barmen
(Barmer Theologische Erklärung)
[8] “Disputa pela Igreja”
(Kirchenkampf)