quarta-feira, 22 de julho de 2015

OS NOVOS “PURITANOS” DA ATUALIDADE


 Uma reflexão, baseada em parte do livro “Santos no Mundo”, sobre como alguns jovens têm errado o caminho, mesmo com a intenção de acertar

Robson T. Fernandes

Um fenômeno recente, mais ou menos, é o despertar que alguns jovens estão tendo sobre a doutrina reformada, especialmente aqueles que fazem parte do meio pentecostal. Sobre isso, Phillip Jenkins acertadamente declarou em seu livro que:

Segundo a maioria das fontes, os integrantes das igrejas pentecostais e independentes já estão na casa das centenas de milhões e suas congregações situam-se, justamente, nas regiões de crescimento populacional mais rápido. Dentro de algumas décadas, essas denominações representarão um segmento muito maior da cristandade global, e é até concebível que componham a maioria. Essas novas Igrejas pregam uma fé pessoal profunda e uma ortodoxia comunal, assim como o misticismo e o puritanismo, todos calcados na clara autoridade das Escrituras. Elas pregam mensagens que, para um ocidental, parecem simplisticamente carismáticas, visionárias e apocalípticas [...] Para melhor ou para pior, é possível que as Igrejas dominantes do futuro tenham muito em comum com as da Europa medieval ou do início da era moderna [...] No futuro previsível, porém, a corrente dominante do cristianismo mundial emergente será tradicionalista, ortodoxa e voltada para o sobrenatural. Isso seria uma inversão irônica da maioria das percepções ocidentais do futuro da religião.[1]

Parece então, segundo vários autores, a exemplo de Jenkins, que o anseio por uma Nova Reforma é a característica marcante do cristianismo evangélico atual e este cristianismo tem sido caracterizado pelo anseio de preservação dos princípios da Reforma Protestante, ao mesmo tempo em que é caracterizado pela crença na atualidade dos dons espirituais. Essa característica do provável cristianismo do futuro talvez seja uma pista da forma como o cristianismo continuará sobrevivendo aos ataques contra a sua identidade e a sua existência. Contudo, parece que este novo movimento poderá perder o rumo facilmente, especialmente quando se alia a força, vigor e disposição da juventude à sua imaturidade e falta de orientação adequada.

Acredito que uma das primeiras questões a serem observadas, portanto, diz respeito ao “estilo” de vida do cristão. Apenas esta descrição, apresentada do livro "Santos no Mundo", já é suficiente para se escrever um livro sobre conduta cristã, criação de filhos, ética etc. Na citação encontrada neste livro, um mestre-escola puritano declarou sobre o jovem puritano:

ele não será um jogador ou frequentador de tabernas ou casas de cerveja, ou um beberrão ou ... dado a flertes frívolos ou a comportamento impróprio com mulheres, ou pródigo em despesas desnecessárias, no seguir modas vãs e pomposas de vestuário, ou ... usar cabelos longos, crespos ou na moda dos rebeldes, ou ... ser um blasfemador ou praguejador ...[2]

Isso por si só já demonstra como o movimento neopuritano, apresentado e defendido por muitos jovens da atualidade, está distante anos-luz daquilo que eram os verdadeiros puritanos. Na verdade, o que temos presenciado, me parece, é uma tentativa, por parte de alguns, de fugir da igreja e ir para o mundo com um respaldo teológico para isso, ou, em outros casos, o desejo de começar a sua própria igreja, particular, que siga os seus próprios moldes.

Salvo algumas exceções, é claro!, para não pecar em generalizações, o que vemos hoje, em boa parte dos casos?

Vemos jovens que se reúnem sob a "liderança" de crianças imaturas sem testemunho, sem vida, que não têm domínio próprio em nenhuma área de suas vidas. Jovens que pensam que só porque leram este livro, Santos Mundo, agora são puritanos.

O que tenho visto é que tais jovens estão apenas blasfemando contra aquilo mesmo que afirmam ser. Muitos desses jovens, que conheço pessoalmente, não têm domínio sobre o seu próprio estômago (glutões), não têm domínio próprio sobre seus namoros (sexo), são insubmissos (rebeldes), se reúnem para beber vinho em bares publicamente e são irônicos escarnecedores.

Esses jovens, que têm até um ‘certo’ jeito para ‘liderar’, para minha enorme tristeza, pensam que basta falar "manso", reunir um grupo, ler um livro e se vestir com a aparência de um líder e autoridade espiritual da graça divina.

Vejo muitos desses jovens que não se envolvem com suas igrejas e nem colaboram com seus pastores, mas buscam uma vida paralela e oculta ao mesmo tempo. Mas, achando-se puritanos, se esquecem da principal característica dos puritanos, que era sondar a si mesmo da forma mais profunda possível para buscar na Graça Divina a força para arrancar de si mesmo até aquele que poderia ser visto como o menor dos pecados.

A maior marca de um puritano era sondar a si mesmo. Esses gigantes da fé tinham, via de regra, diários em que registravam seus pecados, clamores e alianças com Deus. “A consciência do pecado flui com força nos diários puritanos, mas da mesma forma a conscientização da graça divina”[3]. Nesses diários eles “delineavam a graça de Deus em suas vidas quotidianas”[4]. Assim como Cotton Mather escreveu: “Um cristão deve sempre, pensar humildemente de si mesmo, e ser cheio de reflexões de humilhação própria e autoaversão. Abominando-se continuamente, e sendo muito sensível às suas próprias circunstâncias repugnantes, um cristão faz o que é muito agradável ao céu”[5]. A seriedade quanto a isso era tal que o mesmo “Cotton Mather advertiu: "Guardai-vos de ... uma cabeça forte e um coração frio"”[6], enquanto que Samuel Ward registrou em seu diário o peso que sentiu pelo seu pecado, o pecado de ter sido “tedioso” no culto oferecido a Deus.

Que Deus nos livre do legalismo, mas ao mesmo tempo do mundanismo. Que Deus nos livre antinomismo, mas ao mesmo tempo da graça barata. Que Deus nos livre do emocionalismo, mas ao mesmo tempo da frieza. Que Deus nos livre de nós mesmos, mas ao mesmo tempo nos ajude apesar de que somos.

Finalizo, portanto, convidando o leitor a, juntos, fazermos o mesmo voto encontrado no diário de John Winthrop:

Fiz um novo pacto com o Senhor, que foi assim: Da minha parte, que eu reformaria estes pecados pela sua graça: orgulho, cobiça, amor ao mundo, vaidade de pensamento, ingratidão, indolência, tanto no seu serviço como no meu chamado, e não me preparar com reverência e retidão para chegar à sua Palavra. Da parte do Senhor, que Ele me daria um novo coração, gozo no seu Espírito; que Ele habitaria em mim, que me fortaleceria contra o mundo, a carne e o diabo, que me perdoaria pelos meus pecados e aumentaria minha fé.[7]

Amém.






[1]
JENKINS, Philip. A Próxima Cristandade: A chegada do Cristianismo Global. Rio de Janeiro: Record, 2004.p.23-25.

[2]
RYKEN, Leland. Santos no Mundo. São José dos Campos: Fiel, 2013. p.52

[3]
Idem. p.49.

[4]
Idem. p.48.

[5]
Idem. p.34.

[6]
Idem. p.51.

[7]
Idem.p.54.

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