domingo, 7 de junho de 2015

COMO OCORRE A SALVAÇÃO DE QUEM NÃO OUVE O EVANGELHO?


Uma breve reflexão sobre a doutrina bíblica da salvação entre os povos não alcançados

Robson T. Fernandes

Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego; visto que a justiça de Deus se revela no evangelho, de fé em fé, como está escrito: O justo viverá por fé.
A ira de Deus se revela do céu contra toda impiedade e perversão dos homens que detêm a verdade pela injustiça; porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou.
Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; porquanto, tendo conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o coração insensato.
Romanos 1:16-21

Em Romanos 1 o apóstolo Paulo nos ensina que os atributos invisíveis de Deus, o Seu eterno poder e também a Sua própria Divindade são claramente vistos desde a criação do mundo, sendo percebidos mediante as coisas que foram criadas, de modo que as pessoas que não reconhecem isso são indesculpáveis. Da mesma forma, o Salmo 19 nos diz que a natureza proclama a glória de Deus, fazendo assim a maior pregação de todos os tempos. Ainda, temos o texto de Atos 4:12 que declara enfaticamente: “E em nenhum outro há salvação; porque debaixo do céu nenhum outro nome há, dado entre os homens, em que devamos ser salvos”.

Os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras das suas mãos.
Um dia discursa a outro dia, e uma noite revela conhecimento a outra noite.
Não há linguagem, nem há palavras, e deles não se ouve nenhum som; no entanto, por toda a terra se faz ouvir a sua voz, e as suas palavras, até aos confins do mundo. Aí, pôs uma tenda para o sol, o qual, como noivo que sai dos seus aposentos, se regozija como herói, a percorrer o seu caminho.
Salmo 19:1-5

Contudo, existe um grupo de pessoas que pensa que os índios, por exemplo, podem ser salvos simplesmente por não ter conhecimento das verdades bíblicas e que para eles, por exemplo, o meio de salvação seria outro.

Se isso for verdade, teremos então uma classe de seres humanos distintos, e teremos da mesma maneira uma forma de tratamento distinta da parte de Deus.

Acreditamos que esse pensamento exista por duas razões básicas: 1. Discriminação e 2. Desconhecimento.

DISCRIMINAÇÃO

Discriminação porque muitas pessoas acham que os índios são inferiores ao homem branco e que ele não tem a mesma capacidade do homem “civilizado” ou que não está na mesma condição. Alguns até argumentam que o índio é um “ser inocente”. Mas, isso também não é verdade, especialmente porque o índio tem tanta inteligência e capacidade quanto qualquer outro ser humano e está sujeito as mesmas condições e tratamentos que qualquer outro homem, tanto pra fazer coisas boas quanto para fazer o mal.

Essa separação de classes é típica daqueles que praticam a desigualdade social e a discriminação, mesmo que “bem intencionada”. É o mesmo pensamento daqueles que pensam que defender as “cotas” para os negros na universidade brasileira é uma forma de manter a igualdade social, quando na verdade é apenas uma forma de alimentar uma discriminação racial e institucionalizar uma divisão de classes, assim como também ocorre na Índia com as suas castas, por exemplo. Mas, para não fugir de nosso tema, vejamos dois pensamentos indígenas que ilustram o quanto essas pessoas também têm acesso às verdades Divinas, reveladas por meio da criação Divina e colocadas na mente humana, independente de sua classe social, raça, tribo ou status:

O ÍNDIO E A NATUREZA HUMANA

"Um velho índio descreveu certa vez em seus conflitos internos:
- Dentro de mim existem dois cachorros, um deles é cruel e mau, o outro é muito bom e dócil. Os dois estão sempre brigando...
Quando, então, lhe perguntaram:
- Qual dos cachorros ganharia a briga?
O sábio índio parou, refletiu e respondeu:
- Aquele que eu alimentar"
(BETANIA, 2009, online)

Ao observar o texto, de autoria desconhecida, percebemos na sabedoria indígena o mesmo princípio apresentado pelo apóstolo Paulo em Gálatas 5:17: “Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que, porventura, seja do vosso querer”. Podemos ver com isso, que o índio, mesmo não tendo acesso às verdades da Sagrada Escritura, possui em sua intelectualidade, em seu coração, valores que ali foram implantados pelo Seu Criador e que o tornam responsável diante de Deus, como determina Romanos 1.

Outro exemplo pode ser dado por meio do discurso em alusão ao Dia do Índio, quando o Senador Paulo Paim relembrou um mito indígena da “Terra-Sem-Males”:

De tantos mitos e lendas da cultura indígena, há um que fala da Terra-Sem-Males. Esse lugar seria o centro do mundo, do universo, em que os homens seriam iguais entre seus iguais. Um planeta melhor, mais pleno, mais feliz, sem guerra nem ódio, com terra, água e pão para todos.
(PAIM, 2012, online)

Essa Terra-Sem-Males do mito indígena não seria semelhante a esperança da vida eterna em Cristo na Glória celestial, claramente apresentada no livro de Apocalipse?

Podemos ver com isso que reside no índio, também, um vazio do tamanho de Deus, como declarou o romancista russo Fiodor Dostoieviski e como afirmou o brilhante matemático Blaise Pascal: “há no homem um buraco na forma de Deus”. Assim sendo, se este vazio tem o tamanho e a forma de Deus, apenas o Senhor Deus é quem tem as condições ideais para preencher tal lacuna na alma humana. Esse vazio é que faz com que os homens, sendo índios ou não, sonhem com a esperança de uma Terra-Sem-Males. Mas, apenas o Senhor Deus, por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador, é que pode concretizar essa esperança, não aqui, mas na glória celestial, na vida eterna, no porvir.

Essa esperança de uma Terra-Sem-Males  evidencia que a alma do índio está insatisfeita com esta vida e com esta terra, mas ainda, as distorções deste conto indígena também evidenciam que a sua religiosidade está distorcida e que este precisa de um direcionamento correto à luz da Sagrada Escritura.

O que dizer ainda das histórias existentes nas diversas tribos indígenas ao redor do Globo sobre a Criação do mundo ou de um Dilúvio?

O fato é que os índios não são uma espécie subdesenvolvida da raça humana. Não! Coloque um computador, automóvel ou qualquer outro aparelho em suas mãos, ensine-o a usar e ele fará tão bem quanto qualquer outra pessoa. Por semelhante modo, ao estudar a alma indígena nos encontraremos com as mesmas insatisfações, limitações e distúrbios encontrados em qualquer outra alma de qualquer outra pessoa. Se estudarmos a espiritualidade indígena encontraremos as mesmas distorções encontradas em qualquer outra pessoa que esteja distante de seu Criador.

Aos olhos de Deus não existe distinção entre um índio ou um homem branco europeu, entre um grego ou judeu.

DESCONHECIMENTO

Acreditamos que é aqui que reside a maior questão dessa problemática, e isso ocorre não por um mero desconhecimento sociológico, filosófico ou cultural, ou seja, por um desconhecimento meramente científico, mas pelo desconhecimento bíblico-teológico, especialmente porque estamos tratando de um assunto doutrinário: soteriologia (a doutrina da salvação).

A doutrina bíblica da salvação nos ensina, em seus pressupostos mais básicos, que o ser humano é um pecador por natureza (Rm 3:23) e que apenas Jesus Cristo salva o pecador (At 4:12), e isso é afirmado e mantido tanto por calvinistas[1] quanto por arminianos[2]. Aqui não existe campo de batalha, divergência ou discussão entre ambos.

Então, se todo ser humano é um pecador por natureza e os índios também são seres humanos, assim como em qualquer outra pessoa, neles, nos índios, reside a natureza caída, a morte espiritual. Ainda, se apenas Jesus Cristo é o meio de salvação para qualquer homem debaixo do céu e os índios são homens e estão debaixo do céu, apenas Cristo pode lhes salvar de seus pecados, assim como pode fazer com qualquer outra pessoa.

Por fim, e só reafirmando a questão, não é pelo conhecimento da existência de Deus por meio da natureza que os índios serão salvos. Esse conhecimento é chamado de Revelação Geral. Esta Revelação Geral não conduz o homem à salvação, mas ao reconhecimento da existência de um Deus Criador que merece ser adorado. O que salva o ser humano, incluindo o índio, é a Revelação Especial, ou Específica. Essa Revelação é concedida por meio da pregação do Evangelho juntamente com a ação do Espírito Santo que usa essa pregação para convencer o homem pecador. Para convencer o homem da Verdade que liberta (Jo 8:32,36).

Então, para entender isso com maior clareza, vejamos o maravilhoso texto de Romanos 10: 11-15:

Porquanto a Escritura diz: Todo aquele que nele crê não será confundido.
Pois não há distinção entre judeu e grego, uma vez que o mesmo é o Senhor de todos, rico para com todos os que o invocam.
Porque: Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo.
Como, porém, invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem nada ouviram? E como ouvirão, se não há quem pregue? E como pregarão, se não forem enviados? Como está escrito: Quão formosos são os pés dos que anunciam coisas boas!

Com isso podemos entender que a salvação, tanto para índios como para os não indígenas, ocorre por meio da pregação do Evangelho de Cristo, uma vez que o Espírito Santo deseje usar essa pregação para convencer o ouvinte (Jo 16:8).

Então, a sequência apresentada pelo apóstolo Paulo é esta:

01. É preciso crer para não ser confundido;
02. Não existe nenhuma distinção entre indignas e não indígenas, judeu e grego etc;
03. Jesus Cristo é Senhor de todos e tem resposta para dar aos que O invocam;
04. Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo. O índio precisa clamar por Jesus;
05. Antes de invocar o índio precisa crer;
06. Para crer o índio precisa ouvir o Evangelho;
07. A pregação genuína do Evangelho enfatiza a Cristo e Sua obra;
08. Para que isto ocorra é preciso que alguém que já conhece a Cristo apresente a Cristo;
09. É preciso que o pregador seja enviado até os índios, ou aos povos não alcançados;
10. A vida de quem se dispõe a fazer esta obra é formosa aos olhos de Deus,.

CONCLUSÃO

Respondendo a pergunta feita: COMO OCORRE A SALVAÇÃO DE QUEM NÃO OUVE O EVANGELHO?

Não ocorre!

Não existe uma forma de ser salvo sem a pregação do Evangelho e sem a crença no Evangelho de Jesus Cristo. Não existe outra forma. A única forma de alguém ser salvo, seja índio ou não, é através da pregação do Evangelho de Jesus Cristo.

O índio não é uma subespécie humana e nem uma sub-raça, muito menos o índio é um tipo de ser humano inocente, especialmente porque a história já demonstrou que ele é capaz das maiores atrocidades, assim como qualquer outra pessoa.

Ainda, não é porque o índio está em contato com a natureza que isto lhe torna apto a ser salvo. Não! Precisamos lembrar que a salvação não vem pelas obras (Ef 2:8,9). O contato com a natureza lhe dá a condição de ouvir a voz de Deus de forma geral, assim como a sua capacidade mental lhe torna apto a adorar ao Criador, ao invés de adorar plantas e animais, recaindo no panteísmo, animismo e idolatria, tornando-o por isso indesculpável.

Por fim, o índio precisa ouvir o Evangelho e crer em Jesus Cristo para ser salvo. Mas, “como crerão naquele de quem nada ouviram? E como ouvirão, se não há quem pregue? E como pregarão, se não forem enviados?”.

Aqui, então, nos deparamos com uma dupla responsabilidade: 1. A responsabilidade de alguém querer ser enviado, de alguém se dispor e dizer: Senhor, eis-me aqui, envia-me a mim; 2. A responsabilidade da Igreja enviar esta pessoa e ser responsável por lhe manter no campo missionário onde ela poderá ir até esses índios e esses povos não alcançados, para cumprir a finalidade bíblica da Igreja: tornar-se formosa pelo anúncio das Boas Novas.

Uma oura questão, ainda mais complexa envolve agora o debate entre calvinistas e arminianos: O que faz então esses índios crerem nessa pregação? É a sua própria vontade livre (arminianos) ou eles só crerão se o Senhor lhes conceder o dom da fé (calvinistas)?

Esse é um debate que ficará para outro artigo, em outro momento.

Que Deus lhe abençoe e que a chama do Evangelho arda em seu coração de tal maneira que outras vidas sejam incendiadas pela sua vida que honra e proclama o Evangelho de Cristo.





Bibliografias

BETANIA, Marta. O ÍNDIO E A NATUREZA HUMANA. 17 de dezembro de 2009. Disponível em: http://vidalight.blogspot.com.br/2009/12/o-indio-e-natureza-humana.html. Acesso em 07 jul 2015.







[1] Calvinista. Aqui, especificamente, o termo é utilizado de forma restrita para se referir àqueles que creem na doutrina bíblica da predestinação.
[2] Arminianos. Aqui, especificamente, o termo é utilizado de forma restrita para se referir àqueles que creem na existência da livre agência (liberdade de escolha no que se refere as coisas espirituais).

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